A MEMÓRIA É A VOZ DA SOMBRA
Considero os últimos 30 anos do meu trabalho como sendo cerca de 30 segundos de pose. Isto poderá explicar a razão pela qual parece ter sido só ontem que iniciei a minha vacação de fotógrafo… uma série de momentos traçados na luz. Os raios de luz que atingem a emulsão do filme na superfície do meu olho.
Abraço o abstracto na fotografia e existo em escassos de ordem extraídos do caos da realidade. Compondo a imagem, enquadrando a ideia dentro do rectângulo d’ouro, cria-se a sensação de se viver intensamente um momento presente. A fotografia não se move no tempo: nem para trás nem para a frente. A câmara torna-se um ponto fixo à volta do qual gira o Universo, uma bússula eternamente procurando e encontrando o Norte Verdadeiro.
Acreditando na fotografia como sendo o estado de espírito mais desejável, a inspiração torna-se um dos aspectos cruciais do meu processo criativo. Sinto no estar vivo um grande mistério e tenho prazer em fazer fotografias que contêm definições aceitáveis destas questões. Quanto mais se reflete, mais se tem que fotografar. Sou geralmente inseguro em relação aos meus trabalhos, mas vim a reconhecer isso como um bom sinal… como se a imagem antecedesse a minha capacidade imediata de a compreender. Descobri há alguns anos que a sequência de fotografias numa página me aproximava mais do seu sentido. Neste aspecto, os livros são perfeitos. As imagens flutuam na superfície, fixando o observador, definindo a ideia de que a arte é autónoma, mas que precisa de ser observada para existir… É imperativo que eu olhe constantemente.
Os olhos focam e desfocam ao ritmo de cada pulsação, o intelecto e a teoria são inimigos da inocência.
A Memória é a Voz da Sombra.
Ralph Gibson
Nova Iorque, 1 de Janeiro de 1987
(In Tropism, Aperture NYC)